Poemas

Por nossos sonhos
Alusivo aos 40 anos sem Che Guevara
Antonio Carlos Freitas Souza


Livros que comprei em bancas
Devorados em minutos
Outrora lidos às escondidas
Alimento da nossa consciência de classe


Pôsteres no quarto
Desejos na mente
Sonhos nas mãos
Ideais na cabeça

Ternura no olhar
Rebeldia Juvenil
Consciência histórica
Desejos humanos


Lutas apaixonadas
Apaixonantes
Embaladas por canções revolucionárias
Dentre elas tua voz libertária

Embalo dos meus sonhos mais generosos
Referência da geração que me abriu com sua própria vida e caminho
Como tu fizeste, como outros milhares

Abatidos no ardor de suas juventudes
Pela reação anti-humana
Desesperada e sem sucesso
No seu ódio genocida anti nossa liberdade


Não te calaram
Não os calaram
Não nos calaram
Não nos calarão

Estarás no memorial da humanidade
Homenagem de homens e mulheres emancipadas
Construído a cada dia de luta
Por homens e mulheres que arriscam sua própria vida
Por nossos sonhos

Che Guevara presente

Viva o Socialismo!



Cerco ao Castelo
Afonso de Sousa

Conspiremos susurros
Montando discretas barricadas
Que acomodem fronteiras
De amor e libertação

Cerco ao Castelo!
Tomando do Rei suas madrugadas
Decapitando cuidadosamente sua arrogância
Com palavras e ação

Fogo sobre o muro
Marchas populares
Armas de madeira
Mente e coração

Dissolvem-se fluxos
Por bandeiras empunhadas
Circulos sem ira
Ao povo, um novo pão

Novos olhares
Novas alvoradas
De força colorida
Ao Rei, o direito à rendição!



Perguntas de um operário que lê
Bertold Brecht

Quem construiu Tebas, a das sete portas?
Nos livros vem o nome dos reis,
Mas foram os reis que transportaram as pedras?
Babilònia, tantas vezes destruida,
Quem outras tantas a reconstruiu? Em que casas
Da Lima Dourada moravam seus obreiros?
No dia em que ficou pronta a Muralha da China para onde
Foram os seus pedreiros? A grande Roma
Está cheia de arcos de triunfo. Quem os ergueu? Sobre quem
Triunfaram os Césares? A tão cantada Bizâncio
Sò tinha palácios
Para os seus habitantes? Até a legendária Atlântida
Na noite em que o mar a engoliu
Viu afogados gritar por seus escravos.
O jovem Alexandre conquistou as Indias
Sòzinho?
César venceu os gauleses.
Nem sequer tinha um cozinheiro ao seu serviço?
Quando a sua armada se afundou Filipe de Espanha
Chorou. E ninguém mais?
Frederico II ganhou a guerra dos sete anos
Quem mais a ganhou?
Em cada página uma vitòria.
Quem cozinhava os festins?
Em cada década um grande homem.
Quem pagava as despesas?
Tantas histórias
Quantas perguntas


Perguntas de um militante que pensa
Brecht completaria hoje, para livrar-nos do nosso próprio positivismo
Afonso de Sousa

Mao fez a revolução chinesa.
Ele sozinho?
Trotsky foi perseguido por pensar diferente.
Ninguém mais pensava?
Che enfrentou o imperialismo americano,
Lula fez as greves do ABC,
Continuaram a gloriosa obra de Zumbi e Conselheiro.
Da onde vinha toda essa força?
Cuba, por sua vez, cercada por todos os lados.
Que corações e mentes a sustentam, os do Fidel e do Raul?
Quem cozinhava para o comitê central do partido bolchevique durante as longas reuniões.
Quantos morreram para que Tito derrotasse o fascismo?
Onde dormiram os soldados do exército vermelho russo, na noite que tomaram o poder?
No Klemlim?
Em cada década um grande homem.
Quem pagava suas despesas?
Tantas histórias, quantas perguntas.
Tantas iscas, pouca crítica.


"OS ESTATUTOS DO HOMEM"
Thiago de Mello

Artigo I - Fica decretado que agora vale a verdade. Agora vale a vida, e de mãos dadas, marcharemos todos pela vida verdadeira.

Artigo II - Fica decretado que todos os dias da semana, inclusive as terças-feiras mais cinzentas, têm direito a converter-se em manhãs de domingo.

Artigo III - Fica decretado que, a partir deste instante, haverá girassóis em todas as janelas, que os girassóis terão direito a abrir-se dentro da sombra; e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro, abertas para o verde onde cresce a esperança.

Artigo IV - Fica decretado que o homem não precisará nunca mais duvidar do homem. Que o homem confiará no homem como a palmeira confia no vento, como o vento confia no ar, como o ar confia no campo azul do céu.

Parágrafo único: O homem, confiará no homem como um menino confia em outro menino.

Artigo V - Fica decretado que os homens estão livres do jugo da mentira. Nunca mais será preciso usar a couraça do silêncio nem a armadura de palavras. O homem se sentará à mesa com seu olhar limpo porque a verdade passará a ser servida antes da sobremesa.

Artigo VI - Fica estabelecida, durante dez séculos, a prática sonhada pelo profeta Isaías, e o lobo e o cordeiro pastarão juntos e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.

Artigo VII - Por decreto irrevogável fica estabelecido o reinado permanente da justiça e da claridade, e a alegria será uma bandeira generosa para sempre desfraldada na alma do povo.

Artigo VIII - Fica decretado que a maior dor sempre foi e será sempre não poder dar-se amor a quem se ama e saber que é a água que dá à planta o milagre da flor.

Artigo IX - Fica permitido que o pão de cada dia tenha no homem o sinal de seu suor. Mas que sobretudo tenha sempre o quente sabor da ternura.

Artigo X - Fica permitido a qualquer pessoa, qualquer hora da vida, uso do traje branco.

Artigo XI - Fica decretado, por definição, que o homem é um animal que ama e que por isso é belo, muito mais belo que a estrela da manhã.

Artigo XII - Decreta-se que nada será obrigado nem proibido, tudo será permitido, inclusive brincar com os rinocerontes e caminhar pelas tardes com uma imensa begônia na lapela.

Parágrafo único: Só uma coisa fica proibida: amar sem amor.

Artigo XIII - Fica decretado que o dinheiro não poderá nunca mais comprar o sol das manhãs vindouras. Expulso do grande baú do medo, o dinheiro se transformará em uma espada fraternal para defender o direito de cantar e a festa do dia que chegou.

Artigo Final - Fica proibido o uso da palavra liberdade, a qual será suprimida dos dicionários e do pântano enganoso das bocas. A partir deste instante a liberdade será algo vivo e transparente como um fogo ou um rio, e a sua morada será sempre o coração do homem.

Santiago do Chile, abril de 1964